Piedade Líbano Monteiro, presidente da Associação Portuguesa de Síndrome de Asperger (APSA), explica o que a levou a criar a Associação, explicando como é possível apoiar a mesma.
O que a levou a criar a APSA, há 17 anos?
Piedade Líbano Monteiro (PLM) – Depois de ter estado muitos anos nos Estados Unidos da América, o médico que fez o diagnóstico ao meu filho, o Dr. Nuno Lobo Antunes, voltou a Portugal e disse-me que ia fazer nascer o sonho da minha vida. Um espaço onde pudéssemos levar os nossos filhos, para fazer o diagnóstico e trabalhar com eles, nas várias vertentes multidisciplinares: O CADIn, Centro de Apoio ao Desenvolvimento Infantil. Na altura, já tinha deixado de trabalhar e disse-lhe, imediatamente, que eu e o meu marido gostaríamos de colaborar no projeto, como voluntários. O meu objetivo era apoiar as famílias. Dar-lhes o que não tive. Ficava à porta do gabinete do médico para acolher os pais que tinham acabado de receber o diagnóstico. Voltei sozinha do Hospital de Santa Maria para casa, depois de receber o diagnóstico do meu filho. Ninguém merece esta frieza! Deram-me a função de “provedora da família”. Estive no CADIn durante cerca de 10
anos e fiz de tudo. Mas apareciam cada vez mais pessoas em sofrimento no gabinete do Dr. Nuno Lobo Antunes, que nos deu um belíssimo “TPC”: Criar uma associação, cuja intenção era a de consciencializar, desdramatizar, apoiar e encaminhar nestas questões das perturbações do autismo nível I, Síndrome de Asperger. Uma deficiência que não é muito visível e que é, muitas vezes, confundida com hiperatividade,
défice de atenção, entre outras. A APSA nasceu em novembro de 2003, criada por mim, pelo meu marido, Nuno Líbano Monteiro, pelo Dr. Nuno Lobo Antunes e por mais 21 pais que se juntaram a nós. A grande missão da APSA é construir pontes e abrir caminhos, explicando à sociedade que doença é esta.
Como é que explicam esta questão à sociedade?
PLM – Explicamos que não se trata de uma mania, arrogância ou falta de educação. É uma forma de estar completamente diferente do padrão normal, comportamentalmente falando. Explicamos que temos de lidar com a doença, de a aceitar e de aprender a ajudar estas pessoas a fazer o seu caminho, para poderem chegar, tanto quanto possível, ao nosso padrão dito normal. Sem nunca ferirmos a sua
dignidade e a sua individualidade. A APSA tem estado ao lado dos professores, no que é o seu projeto Gaivota, uma ação de consciencialização feita nas escolas a nível nacional. Além disso, já temos autorização da editora britânica Jessica Kingsley, assim como do professor Tony Attwood, psicólogo clínico australiano e especialista em síndrome de Asperger, para traduzir todas as suas obras. Atualmente, já temos o seu último livro traduzido, que penso que é fundamental, por ser uma espécie de manual. Está pronto a ser editado mas em stand by por causa da pandemia. Damos muito apoio aos jovens, na forma como os acolhemos e os ajudamos a descobrir quem são. Apoiamos também as famílias, que podem pedir ajuda mesmo que de forma anónima. Mas, muitas vezes, sinto que algumas não o fazem e deixam arrastar uma situação que pode, mais tarde, tornar-se um problema. As IPSS não podem ser um negócio, têm de ter uma missão: A de ajudar
nestes contextos. Lamentavelmente, substituímos, em muito, o Estado, e para termos dinheiro precisamos de procurar projetos e patrocinadores, que é um trabalho difícil para as IPSS. Gostava de dedicar-me a tempo inteiro à investigação, para me focar no que
é mais importante, sem ter a pressão económica.
Damos muito apoio aos jovens, na forma como os acolhemos e os ajudamos a descobrir quem são. Apoiamos também as famílias, que podem pedir ajuda mesmo que de forma anónima.
De que forma se pode apoiar a APSA?
PLM – Podem apoiar através de donativos, porque temos sempre precariedade financeira; comprar os nossos produtos de costura, ervas
aromáticas e chás, livros, peças de cerâmica, feitos pelos jovens, na Casa Grande. No caso das empresas, podem fazer parte da nossa rede de Empresas Recetivas, capacitadas para receber jovens com síndrome de Asperger nos seus quadros de funções. Também temos parcerias com empresas que vêm ensinar os nossos jovens a nível tecnológico, e parcerias com faculdades. Acolhemos estudantes, desde crianças
da primária até académicos, que fazem trabalhos connosco. Isto é importante. Se ajudarmos os jovens de hoje a lidar com a diferença, seja ela qual for, os homens de amanhã serão totalmente inclusivos. A APSA é uma instituição de porta aberta, independentemente dos
nossos filhos terem este “problema” da socialização. É possível apoiar a APSA com donativos em dinheiro e em género. Se não necessitarmos, encaminhamos para quem precisa e avisamos a entidade que o seu donativo vai ser reencaminhado. A partilha também é um dos nossos valores.
Fale-me da Casa Grande.
PLM – Depois de acabarem a escola, os nossos filhos precisavam de ser capacitados para dar o salto para a vida adulta. De ser ajudados a perceber o que querem fazer e quais as suas capacidades. Além disso, também era preciso que as entidades empregadoras percebessem quem são as pessoas com síndrome de Asperger. Aqui tentamos descobrir e dar a conhecer, à sociedade e às empresas, as imensas capacidades
destes jovens, que só estão à espera de uma oportunidade para as demonstrar. O projeto Casa Grande nasceu para capacitar, preencher e acabar com este fosso entre o fim da escolaridade e o início da vida adulta. É um projeto imenso. Um “milagre” da APSA, por tudo o que tivemos de fazer e por todos os apoios que tivemos de recolher para a reabilitar. Nesta casa, acolhemos jovens a partir dos 18 anos. É um local onde vêm trabalhar para o futuro. São capacitados ao nível do treino de competência social, funcional, pessoal e, até, no sentido de desbravar capacidades vocacionais, desde horticultura e jardinagem, passando pela informática. As artes plásticas e a música são também uma área muito interessante. Temos uma banda que já atuou no Casino Estoril! A Casa Grande está a mudar a vida das pessoas e, neste momento, já temos cerca de 30 empresas a que chamamos de “empresas recetivas”, que assinaram um documento, na presença da Secretária de Estado para a Inclusão. É importante preparar o futuro na escola e, nos últimos três anos de escolaridade, o papel que as escolas, juntamente com outros agentes da comunidade, têm na construção e implementação do PIT (Plano Individual de Transição) para os seus alunos. Devo agradecer ao secretário de Estado da Educação, o Prof. João Costa, que ouviu o nosso “apelo” – e já o fazíamos há muito tempo -, nos desafiou a elaborar um guião para a operacionalização do PIT, que se encontra publicado no site da DGE e nos nossos meios de comunicação.
A APSA desenvolve muitos mais projetos e atividades. Saiba tudo em https://www.apsa.org.pt/pt/